A Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul e a Funai questionam processos de retirada de crianças indígenas das famílias. Uma mulher indígena de 48 anos teve seu filho retirado de sua guarda sob o argumento de que ela não era mãe da criança. O caso divulgado no início deste mês ganhou repercussão nacional na imprensa. Segundo a população local, ela nunca foi vista grávida e este mero argumento foi suficiente para tirar o filho da mãe com apenas 8 dias de vida. Quando o exame de DNA, saiu comprovando a maternidade, a criança já estava em um abrigo.
Ainda assim, Élida de Oliveira, da etnia Guarani-Kaiowá e moradora de uma aldeia em Dourados, não recuperou o seu poder familiar. Desta vez, o argumento era de que ela não tinha condições de criar a criança. De acordo com as informações da Defensoria, a indígena não consegue se comunicar na língua portuguesa e sequer foi citada no processo. Élida teve seu filho arrancado de suas mãos sem saber o porquê, afirma o órgão. Após enfrentar diversas dificuldades burocráticas e financeiras – agravadas pelo fator da língua – ela conseguiu realizar visitas ao filho. O local onde vive é o acampamento Nhu Verá, distante do Lar Santa Rita, onde se encontra a criança. A mãe ainda sofre com a dificuldade de transporte.
Após algumas visitas, foi informada de que não poderia mais comparecer no local para ver a criança, que hoje já tem 3 anos. O tempo que a mãe ficou sem comparecer ao abrigo após a proibição ainda foi usado como argumento de que ela havia se afastado. Após um mandado de segurança contra a decisão de 1º grau que impediu as visitas – e que restabeleceu o contato entre mãe e filho - a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul entrou como procuradora da assistida nos processos de segundo grau, por meio do Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Povos Indígenas e da Igualdade Racial e Étnica (Nupiir).
O Núcleo foi instituído em abril desde ano pela Administração Superior, por meio da Resolução 157/2018, justamente pela preocupação com as questões indígenas no Estado e demandas da Defensoria, principalmente, em cidades do interior onde há uma concentração dessa população, como Dourados e Amambai.
Na decisão que concedeu o retorno às visitas, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul destacou que não houve procedimento contraditório, além de não ter existido a tentativa de reinserção da criança no seio da família natural, com a mãe ou com o pai – o qual não se buscou localizar – ou, ainda, com a família extensa, antes de determinar a sua colocação em família substituta.
“No que diz respeito às alegações de abandono denota-se que há dúvidas quanto a esta conclusão, pois a documentação acostada aos autos aponta que a genitora teria mantido as visitas ao filho, dentro de suas possibilidades, além de haver indícios de que teria sido coagida a entregá-lo, questão que deve ser melhor esmiuçada na origem”, complementa a decisão.
Segundo a coordenadora do Nupiir, defensora pública Neyla Ferreira Mendes, casos como esse são comuns no sul do Estado, onde se encontram as maiores aldeias de Mato Grosso do Sul. “Os assistentes sociais vão até a aldeia, veem que a criança não tem uma cama ou que a família vive numa casa pequena e fazem relatório apontando que não há boas condições. A ação é para retirar a criança e não para ajudar a família”.