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Dourados Terça-feira, 10 de Janeiro de 2012, 11:27 - A | A

Terça-feira, 10 de Janeiro de 2012, 11h:27 - A | A

Rainha da Reforma Agrária é tema de livro

Nicanor Coelho, correspondente em Dourados - Capital News (www.capitalnews.com.br)

Uma vida cheia de dificuldades e tragédias pessoais. Assim foi a saga da agricultora Januária Maria da Conceição nascida em 19 de setembro de 1933 em Caririaçu, região de Juazeiro do Norte, no Ceará. A trajetória de lutas desta nordestina que há trinta anos vive na região da Grande Dourados agora é contada em verso e prosa no livro “A Rainha de Jango”. A biografia autorizada de Januária, que foi coroada em 1964 pelo então presidente da República João Goulart como a Rainha da Reforma Agrária, foi escrita pelo professor Aldair Lucas Carvalho em menos de seis meses conta em minúcias os passos da agricultura.

Depois de perder todos seus descendentes nos últimos dois anos, Januária resolveu contratar um biógrafo para contar sua vida para poder voltar ao Cariri. “Quero voltar para a minha terra para enterrar meus ossos”, diz a veterana agricultura aos 78 anos. Januária esteve pessoalmente no Palácio do Planalto, quando foi recebida por João Goulart, que lhe colocou a faixa de Rainha da Reforma Agrária. Conforme o decreto assinado pelo presidente Januária reinará por cem anos até 2064. Em São Paulo, a Rainha da Reforma Agrária foi metalúrgica quando em 28 de abril de 1963 João Goulart foi até o Sindicato. “Foi um alvoroço, pois todos queriam para o serviço para ver o nobre homem. Os patrões não resistiram e todos pararam as máquinas e os metalúrgicos foram para a rua para sentir o prazer em dizer depois que viram e estiveram com o presidente”, diz um trecho do livro.

Januária, conforme a biografia trabalhava de dia em uma dessas metalúrgicas e à noite como caixa em um cinema. Certo dia apareceu na fábrica um sindicalista de nome Plácido Castelo acompanhado de um cidadão, que Januária só se lembra do primeiro nome, Wilson. Ele estava em busca de uma moça para tornar-se a Rainha dos Trabalhadores. Ela acabou sendo eleita a rainha. No dia primeiro de maio o presidente do Sindicato disse para Januária: “A partir de hoje você será a rainha da Primeira Conferência da Mulher Trabalhadora”.

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Homenageada durante o lançamento do livro "A Rainha de Jango" em Dourados
Foto: Nicanor Coelho/Capital News

Tempos depois Januária foi a Brasília numa caravana de sindicalistas. Durante a viagem de ônibus ela e os sindicalistas participaram de vários comícios apelando ao povo brasileiro que ajudasse João Goulart a realizar um processo de reforma agrária. Chegando a Brasília a Rainha subiu a rampa do Planalto, onde ela e a comitiva foram recebidos por João e sua esposa Maria Tereza. O presidente do Sindicato havia pedido que Januária decorasse a frase que jamais sairia da sua mente. Um silêncio profundo toma conta do Palácio, diz o livro. Januária dá dois passos em direção ao presidente e declara: “Excelentíssimo Senhor Presidente João Goulart, o que me traz à vossa presença é pedir para toda a nação a Reforma Agrária”. Jango respondeu: “Eu aceito!”.

Foi neste momento que Jango, entusiasmado com seus ideais socialistas, assinou o documento em que declarava que Januária seria a Rainha da Reforma Agrária por cem anos até o dia 25 de março de 2064. Uma semana depois Jango foi deposta e iniciou-se a Ditadura Militar. Januária teve que viver escondida. Passou a trabalhar em bares, como empregada doméstica, sempre fugindo.
No início da década de 1980 aportou em Dourados onde foi dona de bar e reconstruiu sua vida. Nunca teve sorte no amor. Em 1999, o Incra fez uma homenagem a Rainha da Reforma Agrária que foi contemplada com o lote 47 no Assentamento São Sebastião no município de Ivinhema. No ano seguinte, Januária foi recebida em Brasília pelo ministro da Agricultura e pelo filho de João Goulart. “Era uma espécie de agradecimento postumamente pela tentativa de Reforma Agrária da parte do então último presidente eleito democraticamente antes de se implantar a ditadura militar no Brasil”, disse o biógrafo. Assim Januária depois de muitas décadas conseguiu seu pedaço de chão.

Obra 'Rainha do Jango' foi lançada em Dourados 

O livro da Rainha de Jango foi lançado em 21 de dezembro no auditório do Sindicato dos Comerciantes de Dourados. No dia seguinte, Januária que havia vendido o seu sítio com a anuência do Incra, juntou as malas de volta a Juazeiro do Norte, terra do Padre Cícero. Voltou em busca das suas raízes, a procura do seu grande amor e para descansar em paz.

Em Fátima do Sul ficou um irmão. Sua única filha morreu vítima de um câncer nos pulmões. O genro morreu antes. A neta de vinte anos não suportou a dor da perda e cometeu suicídio. Januária ficou sozinha no mundo. Apenas a faixa e a coroa de Rainha da Reforma Agrária, sua história e seu legado lhe pertencem. Mas como quem foi “rei não perde a majestade” Januária vai reinar em terras cearenses e contar para o seu povo um pouco da história recente do Brasil.

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Capa da obra que retrata a trajetória de Januária Maria da Conceição, a Rainha de Jango
Foto: Reprodução

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